Atrito

Martelo batendo no mesmo prego, a música no mesmo "tuntz tuntz", bate estaca sem parar. Lixa na mesma parede, reco-reco no mesmo pagodeiro, zumbido no ouvido.

[Tudo fica desgatado.]

O mesmo olhar todos os dias, os mesmo assuntos, os mesmos passos. Uma rotina que não acaba, um roteiro a ser seguido.

[Tudo fica desgastado.]

Barulho da porta velha, cheiro do perfume antigo, o sofá de sempre. Nesse arrastar de coisas, nas coisas feitas já de olhos fechados, no hábito.

[Tudo fica desgastado.]

E de repente as engrenagens do relógio já não se encaixam tão bem, uma superfície já desliza sobre a outra. O jeans já está rasgando, a pele ficando seca, o novelo de lã não se enrola perfeitamente.

[Tudo fica desgastado.]

Já não se vê mais graça na batata frita do almoço, na nota boa na escola, nas piadas dos amigos. E isso se repete todo ano, quando no final, tudo que fazem já não te agrada, e estão todos com overdose do mesmo  lugar. E isso tudo se resolve com férias... Pra na noite da virada de ano, a gente fazer uma lista de desejos, esperando que daí pra frente seja diferente. As esperanças voltam, e a gente passa novamente os dias com a graça no olhar.

Isso tudo é desgaste. Acontece com a família, com os amigos, com os namorados.

Tudo fica desgastado.

Isso tudo é um desabafo do meu stress, do meu cansaço. 
Mas passa. [Tudo passa.]

Beijão queridos.